Entre os inúmeros segredos para um treino eficaz, a alimentação prévia ainda é um dos fatores mais determinantes, e também mais negligenciados. Entender o que o corpo precisa antes de se mover pode transformar completamente o desempenho, a resistência e até a recuperação.
Para muitos, a dúvida surge da experiência prática: quem nunca tentou correr com o estômago pesado, arrependendo-se do almoço apressado? No entanto, a questão vai além do desconforto. A nutrição antes do exercício é o ponto de partida de uma cadeia que influencia energia, metabolismo e resultados a longo prazo.
De acordo com Brian St. Pierre, diretor de nutrição da Precision Nutrition, o que se consome nas três horas que antecedem o treino tem impacto direto na performance. “O ideal é escolher algo que sustente a energia, favoreça a hidratação, preserve a massa muscular e acelere a recuperação”, explica o especialista.
A importância do equilíbrio
Se há uma regra universal, é a de que os carboidratos são os verdadeiros aliados antes de qualquer atividade física. Eles são a principal fonte de combustível do corpo e garantem disposição para esforços prolongados. As proteínas e gorduras também têm seu papel, mas em proporções equilibradas. St. Pierre recomenda uma refeição completa, com esses três macronutrientes, feita entre uma e três horas antes do treino, respeitando a tolerância individual.
Para quem prefere se exercitar logo cedo, uma refeição completa pode parecer excessiva. Nesses casos, pequenas porções de fácil digestão são suficientes para despertar o metabolismo. A nutricionista Liz Wyosnick, fundadora da consultoria Equilibriyum, em Seattle, sugere alternativas práticas como metade de uma barrinha proteica, uma banana, duas tâmaras ou um punhado de castanhas. “É importante escolher alimentos que o corpo processe rapidamente, especialmente em treinos com movimentos explosivos ou intervalados”, explica.
Já o nutricionista Philip Goglia, conhecido por atender celebridades como Chris Hemsworth e Russell Wilson, propõe uma combinação simples e eficiente: uma colher de sopa de pasta de amêndoas com outra de geleia. Segundo ele, a mistura de gordura e açúcar natural oferece energia rápida e ajuda a reduzir a vontade de doces após o treino.
O mito do treino em jejum
A prática do chamado “cardio em jejum” tornou-se tendência entre quem busca queimar gordura. A teoria é sedutora: sem energia disponível, o corpo passaria a usar a gordura como fonte primária de combustível. Mas os resultados da ciência são menos empolgantes. Estudos mostram que o corpo pode até recorrer às reservas de gordura, mas também tende a consumir proteína muscular, o que prejudica a recuperação e a manutenção da massa magra.
Pesquisas mais recentes apontam que o treino em jejum não necessariamente melhora o emagrecimento. “Treinar de estômago vazio não significa queimar mais gordura”, observa Wyosnick. “Com o corpo bem nutrido, é possível se exercitar com mais intensidade, gastar mais calorias e obter uma queima mais eficiente durante e depois do treino.”
Suplementos e estratégias modernas
O mercado de suplementos pré-treino continua em alta, prometendo energia instantânea e foco absoluto. Essas fórmulas combinam aminoácidos, cafeína, carboidratos e extratos vegetais como a beterraba, mas seu uso ainda divide opiniões. “A maioria das pessoas teria resultados muito melhores se simplesmente eliminasse os excessos da dieta antes de investir em produtos artificiais”, avalia o nutricionista e professor Detrick Snyder, da Johnson & Wales University.
Quem optar pelos suplementos deve observar os rótulos com atenção. Como esses produtos não são regulamentados pela FDA, é importante buscar certificações reconhecidas, como as da BSCG ou Informed Sport, que garantem maior segurança e transparência na composição.
A base de tudo: hidratação
Nenhum plano alimentar funciona se a hidratação for negligenciada. “Você pode ter a dieta perfeita, mas se a ingestão de água for insuficiente, o corpo vai reter gordura”, alerta Goglia. A água é essencial para regular a temperatura corporal, lubrificar as articulações e otimizar a função muscular.
A recomendação geral é ingerir cerca de meio litro de água para cada meio quilo de peso corporal por dia. Para quem treina intensamente, essa quantidade deve ser maior. A nutricionista Natalie Allen, da Missouri State University, lembra ainda que câimbras e fadiga muitas vezes são sinais de desidratação leve. “Desenvolver um plano de hidratação e beber com frequência, mesmo sem sede, é fundamental.”
Ela acrescenta que o leite, por conter cálcio e potássio, é uma excelente opção para quem busca recuperar-se após o treino. Além de aliviar câimbras, ajuda a reconstruir o tecido muscular.
O treino começa no prato
No fim das contas, o desempenho não nasce na academia, mas na mesa. Comer de forma estratégica antes de se exercitar não é apenas sobre energia imediata, é sobre preparar o corpo para evoluir. Treinar com consciência alimentar é transformar cada movimento em um investimento real no próprio bem-estar.